quinta-feira, 8 de abril de 2010

Reflexões sobre a Descentralização do Turismo e o Mercado Doméstico em Moçambique

Na medida em que a atividade turística em Moçambique vem alcançando um novo patamar de desenvolvimento, um conjunto de oportunidades de novos negócios vinculados a esta atividade econômica, vem se tornando cada vez mais evidentes.


Entretanto, para que a economia do turismo se desenvolva de maneira mais dinâmica, resulta importante que os Distritos estejam cada vez mais preparados e independentes em termos de capital humano e competências legais.

Para alcançarmos este novo patamar, seria interessante empoderar os distritos que apresentam maior “vocação” para o turismo, a partir de um projeto piloto que exercite de certa forma a descentralização da gestão dos destinos turísticos em Moçambique. O desafio seria constituir a nível local, a massa crítica/técnica necessária para que os “distritos turísticos chave” assumam maior responsabilidade pela gestão e planejamento do turismo, permitindo ao governo nacional maior liberdade para tratar temas chave como as Estatísticas, Promoção e outras políticas Nacionais.

Tendo esta idéia em mente, gostaria de destacar neste artigo, dois conceitos básicos na economia do turismo. O primeiro relacionado com a estrutura do mercado turístico e o segundo, vinculado com a estrutura produtiva do setor. Meu objetivo é apenas provocar uma reflexão sobre a importância de projetos pilotos de esta natureza.

Sobre a estrutura de mercado turístico, veja que quando se pensa em turismo, a primeira imagem que normalmente vem à tona é a de um estrangeiro que esta a visitar Moçambique.

Esta imagem, embora correta, precisa ser ampliada. O foco no turismo estrangeiro se sustenta na sua capacidade de trazer divisas para o país e com isto de oxigenar a economia, entretanto, o mercado doméstico, que esta em franca expansão em Moçambique, merece atenção pois possui características próprias que o tornam extremamente importante.

O mercado doméstico exerce um papel dinamizador em um conjunto de variáveis econômicas fundamentais, podendo destacar sua capacidade de estimular a inclusão social das camadas mais pobres e de distribuir a renda, isto por que o mercado “nacional” reconhece (e / ou deveria) aceitar melhor a cultura e o produto moçambicano.

Assim mesmo o mercado doméstico, quando estimulado contribui com o aumento da escala produtiva, pois por ser potencialmente maior pode permitir ao setor privado a redução dos custos operacionais.

A realidade é que o principal mercado turístico que detém um país é o mercado doméstico. Evidentemente esta não pode ser a realidade de países que vivem em guerra, na extrema pobreza ou de ilhas com baixa população. Embora Moçambique ainda seja um país com dificuldades, que ainda precisa resolver, também é um país que nos últimos 5 anos, apresentou importantes níveis de crescimento econômico, acumulando no período 2005-2010 mais de 30% de expansão do PIB.

Este crescimento se materializa nos milhares de pessoas que alcançaram estabilidade laboral, melhoria na renda, acesso a melhores empregos e inclusive ampliaram sua capacidade de poupança e de consumo. Um indicador disto é a explosão no número de veículos que vemos hoje circulando no país, outro é a crescente expansão e valorização imobiliária.

Estes milhares de Moçambicanos que se beneficiaram do crescimento econômico experimentado são turistas domésticos em potencial, com capacidade de contribuir de maneira impar com a distribuição da renda no país e com o desenvolvimento de uma atividade turística economicamente mais expressiva.

De acordo com o Estudo da Cadeia de Valor do Turismo realizado pela SNV em parceria com o Mitur e os membros do Grupo Consultivo do Turismo da Cidade de Maputo, 44% dos turistas que visitam Maputo, são moçambicanos. Este dado é extremamente importante, no sentido de verificar que o mercado doméstico, já exerce importante influencia no desenvolvimento de Maputo por exemplo, entre tanto é preciso conhecer este segmento mais a fundo e estimulá-lo com ações de Marketing bem direcionadas.

O turista moçambicano é um gigante que precisa entrar em cena para viabilizar maiores investimentos públicos, a entrada de novas empresas de aviação, rodoviárias, hoteleiras, assim como a expansão de milhares de novas Pequenas e Médias Empresas (PeME´s).

Tem um dado que gosto de partilhar pois ilustra bastante estas idéia. No Brasil, são 50 milhões de turistas domésticos por ano. Em contrapartida, são 5 milhões de turistas estrangeiros que visitaram o Brasil em 2008.

Na sua opinião, poderia a industria brasileira de turismo ter a mesma força se tivesse uma grande dependência do mercado internacional? Poderíamos ter no Brasil, 5 empresas aéreas competindo entre si e movimentando mais de 43 milhões de viagens aéreas internas sem um mercado domestico forte?

Feita esta reflexão, agora vejamos o segundo ponto, aquele vinculado a estrutura produtiva do turismo, para isto, apresento alguns indicadores econômicos.

De acordo com pesquisas recentes foi identificado que mais de 85% da indústria do turismo da França esta constituída por PeME´s, no Brasil o segmentos das PeME´s corresponde 85% da industria e na Espanha se atinge 90%.

Estes dados revelam uma característica essencial da estrutura produtiva do turismo. O turismo é eminentemente uma atividade constituída por PeME´s. Evidentemente a presença de estruturas básicas de logística, comunicação e segurança, são fundamentais, entretanto, atendidas estas estruturas básicas, o coração do setor é estimulado pela inovação e criatividade dos pequenos e médios empreendedores.

É com esta consciência, sobre a importância do mercado domestico e da relevância das PeME´s que os atores do setor e doadores poderiam olhar com muito carinho para um programa de descentralização da gestão dos destinos turísticos em Moçambique, tendo talvez como distritos/municípios piloto a própria cidade de Maputo, Inhambane e Ilha de Moçambique, apenas para mencionar alguns.

Não podemos esquecer que o turismo é um fenômeno local, cujos problemáticas precisam ser compreendidas e resolvidas neste âmbito. Neste sentido os Distritos de Moçambique ocupam um papel central para ordenar o território e planejar estímulos que encorajem ao todos aqueles que sonham com ser empresários a investir, e com isto, ajudar ao desenvolvimento de seu país.

Que vivam o empreendedor Moçambicano, que viva o mercado doméstico!



Federico Vignati
Assessor Sênior de Desenvolvimento Econômico da SNV
Autor do Livro: Gestão de Destinos Turísticos publicado no Brasil pela Editora SENAC.